domingo, 30 de dezembro de 2018

Dar nomes aos gatos (T. S. Eliot)

The Naming of Cats is a difficult matter,
It isn't just one of your holiday games;
You may think at first I'm as mad as a hatter
When I tell you, a cat must have THREE DIFFERENT NAMES.
First of all, there's the name that the family use daily,
Such as Peter, Augustus, Alonzo or James,
Such as Victor or Jonathan, George or Bill Bailey -
All of them sensible everyday names.
There are fancier names if you think they sound sweeter,
Some for the gentlemen, some for the dames:
Such as Plato, Admetus, Electra, Demeter -
But all of them sensible everyday names.
But I tell you, a cat needs a name that's particular,
A name that's peculiar, and more dignified,
Else how can he keep up his tail perpendicular,
Or spread out his whiskers, or cherish his pride?
Of names of this kind, I can give you a quorum,
Such as Munkustrap, Quaxo, or Coricopat,
Such as Bombalurina, or else Jellylorum -
Names that never belong to more than one cat.
But above and beyond there's still one name left over,
And that is the name that you never will guess;
The name that no human research can discover -
But THE CAT HIMSELF KNOWS, and will never confess.
When you notice a cat in profound meditation,
The reason, I tell you, is always the same:
His mind is engaged in a rapt contemplation
Of the thought, of the thought, of the thought of his name:
His ineffable effable
Effanineffable
Deep and inscrutable singular Name.

Dar Nomes aos Gatos
T. S. Eliot

Dar Nomes aos Gatos é uma questão muito difícil,
Não apenas um mero jogo de palavras;
Poderá pensar que sou como o Chapeleiro Maluco
Quando lhe digo que um gato deve ter TRÊS DIFERENTES NOMES.
Primeiro, o nome como a família o chama todos os dias,
Como Pedro, Augusto, Alonso ou Jaime,
Como Vitor ou Jônatas, Jorge ou Bill Bailey –
Todos nomes diários e racionais.
Há nomes mais bonitos, se quiser sons mais suaves,
Alguns para os machos, outros para as fêmeas:
Como Platão, Admeto, Electra, Deméter –
Mas todos nomes diários e racionais.
Mas, digo-lhe, um gato precisa de um nome especial,
Um nome peculiar e mais digno,
Senão como manterá sua cauda perpendicular,
Ou inflará seus bigodes e alimentará seu orgulho?
De nomes desse tipo, posso fazer uma lista,
Como Munkustrap, Quaxo ou Coricopat,
Como Bombalurina, ou até Jellylorum –
Nomes que só podem ser de um gato.
Mas, acima e além disso, falta ainda um nome,
E este nome jamais saberão;
Um nome que nenhuma pesquisa revelará –
Mas O PRÓPRIO GATO SABE e nunca confessará.
Quando vir um gato em meditação,
A razão, lhe digo, é sempre a mesma:
Sua mente está ocupada em longa contemplação,
Pensando, pensando, pensando em seu nome:
Seu inefável pronunciável
Pronuncinefável
Singular, profundo e inescrutável nome

Tradução de Thereza Christina Rocque da Motta


O gato que passa (Gerson Valle)


O gato que passa
miando o choro de um bebê
me olha e me vê
como se eu fosse meu antepassado
lembrado em sua memória genética.

Nossos legados vão comandando
meus impulsos humanos
e seus passos brandos.
Seus olhos atentos
pelas madrugadas vão trepando
telhados e gatas
pelo instinto das garras.

Eu me sento e assisto,
pela TV ou internet,
a passagem dos séculos
com todos nossos vícios,
expondo-nos às miradas e feitiços
dos gatos e outros bichos.

Enquanto eu me debruço
no espírito do pássaro
fugindo à gula dos gatos,
a terra se rebela
contra a pacatez da espera.

Por dentro um grito
sai quebrando as pedras.
O vulcão vomita, o mar se agita,
o morro desfaz-se sobre as casas do bairro,
enterrando homens e mulheres
em seus abraços de orgasmos
de olhos fechados
como se não houvesse entorno.

E o que fica me desatina,
querendo rever a porção antiga
sem mais briga.
Agora que a força do braço torto
tornou-se no corpo morto
todos se perguntam a hora
em que a bomba estoura...

O gato espia
com ironia
toda utopia...

"Razão distópica", de Gerson Valle, in “Utopias na contramão”, Ibis Libris, 2018