sexta-feira, 24 de agosto de 2018

Meu gato que não tenho (Alice Monteiro)


Penso que os poetas gostam de gatos.
Eu não fujo à regra.
E o gato que não tenho
sobe no meu armário,
desarruma meus vestidos
e se esconde das visitas inesperadas.

O gato que não tenho é macho e se chama João.
Ele passeia entre as peças de cerâmica
do aparador da sala e não quebra nada.
O gato que não tenho é um equilibrista.

Ele tem uma independência que me seduz.
Brinca como criança e sabe ser feliz
com pouca coisa.

O gato que não tenho é elegante, prateado
e de olhos cor de ardósia,
mas não é o Chico.

O gato que não tenho finge que não existo.
Mas seu lugar preferido é perto dos livros.
Acho que João gosta de ler.

Alice Monteiro, in "Ultramar e outros mares", Ibis Libris, 2018


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